quarta-feira, março 24, 2004

little black spot o Sol. tomado como certo que estará presente nas nossas vidas, dia após dia. tão certo como o sol nascer amanhã. uma estrela de modestas dimensões suspenso no negro silêncio do universo, ainda assim milhares de vezes maior do que o ponto azul claro em que habitamos, inflamando-o de um sopro de vida extraordinário, cheio de implicações poéticas e metafísicas.
mas, como tudo o que é vivo - e um universo que pulsa, que se move em alternada expansão e contracção, não será a última coisa viva por excelência? - não existirá para sempre, e o seu destino será este.
quando o Sol esgotar a sua fonte de energia nuclear, o seu combustível, o núcleo colapsará e a sua matéria começará a implodir, conduzindo a um dos mais violentos eventos conhecidos no Cosmos: a explosão que dá origem a uma supernova *. ainda faltam alguns biliões de anos até à morte da nossa estrela, é certo, e não é sequer possível prever se haverá então vida na Terra que se extinga com o seu desaparecimento. no entanto, é assombroso pensar nisso. no limite onde a ciência procura explicar (compreender) tudo em termos físicos, não será ainda assim onde a poesia é mais brutalmente extasiante?

sexta-feira, março 12, 2004

little black spot [2004] sinto-me como estrangeira dentro de mim mesma. parece que finalmente as palavras se tornaram pedras.

e depois acontece-me isto, de me tentar o bloguicídio. é um desejo drástico de mudança, presumo, o natural cansaço de ver sempre este nome neste exíguo quadro branco. não sei — e suspeito que não me interessa saber — para que serve um blog. pensá-lo, encontrar-lhe resposta, seria então matá-lo. sei apenas que nasce um blog um dia inesperado a partir de uma coisa qualquer sem significado, por motivo de um desgosto de amor, por motivo de uma noite demasiado longa. e isso já basta. mantém-se um blog enquanto faz sentido fazer dele alimento para uma sede qualquer que só cada um conhece.

aquilo que também sei é que, por muita estranheza que nos habite, por muito que o silêncio nos arrebate, por muito que acreditemos na inexorabilidade das despedidas, a vida só nos rouba da escrita por breves momentos. devolve-nos logo a seguir, quando o julgávamos mais improvável. é que isto de ter um blog, afinal, é como estar no Hotel California: you can check out any time you like, but you can never leave.

quinta-feira, março 11, 2004

wonderland Blog é um fragmento de weblog. Um blog é um fragmento de alguém. A blogosfera é uma soma de fragmentos com resultado incerto.

(...)

Antes do romance: um blog é apenas uma web page. Pode ser uma página pessoal, de (des)afectos. Pode ter a frieza da seriedade. É suposto ser construída aos pedaços, um por cada dia. A palavra domina, mas há quem arrisque a imagem. Nunca se chega ao produto final. Há sempre o dia seguinte. Ou não. Há quem desista. Como cá fora, todos os dias nasce e morre gente. A diferença está no poder de escolha.

(...)

Entretanto: como Alice, vamos explorando o desconhecido, abrindo portas, escolhendo, arriscando. Vamo-nos cruzando com palavras nunca lidas, com frases batidas, com perguntas idiotas e pertinentes que nos param o olhar. Há aí uma certa prisão. Uma teia que nos vai enredando, a que vamos voltando. Há um vício que se instala nos dedos que se instalam nas teclas. As palavras que se escrevem se apagam se lêem. Vamos espiando outros que nos entregam as suas realidades ou as suas ficções, as suas verdades e os seus enganos. Há um voyeurismo permitido, desejado e sem sentimentos de culpa.

[Post inteiro]

terça-feira, fevereiro 10, 2004

Segredos
irrita-me o falso esplendor contínuo,
onde a treva e a lama não penetram nunca.
a beleza infinita das palavras é uma mentira,
mar também se escreve com f de fome
e flor também se escreve com m de morte.

sexta-feira, janeiro 30, 2004

Voz do Deserto Ouve-se
O portugueses só falam de Deus na morte. Triste vida.

quinta-feira, janeiro 29, 2004

Ruminaçœs Digitais Fora aqueles que o fazem por motivos premeditados, manter um blog é uma actividade que oscila entre o prazer de um passatempo e a paciência de um cultivo. Torna-se comum encontrarmo-nos a pensar num tema, a ler uma ideia ou a trabalhar uma frase para estas notas acumuladas semanalmente. Pára-se o resto para escrever as fugidias palavras que receamos perder, finge-se atenção enquanto se lapida mentalmente o post de amanhã. Outras vezes, simplesmente, falta o motivo para continuar. Porque terminam metade dos blogs ao fim de um semestre? Não sei, mas talvez seja consequência da tensão entre o acto narcísico de expor aquilo que achamos interessante, estético (e que nos espelha para os outros) e a autocrítica sobre essa exposição. Uma prolonga (por vezes penosamente) o esforço enquanto outra questiona a validade do mesmo. Quando não há tensão ou o blog termina ou prossegue soterrando aquilo que merece a pena ser visto, lido, relembrado. Neste aspecto suponho ser semelhante ao ser-se escritor, que como alguém disse não é por aprender palavras novas que estes se fazem, é por haver coisas a dizer.
little black spot explosões de luz
epiderme (por revelar preciosidades escondidas na distracção dos dias)

quarta-feira, janeiro 28, 2004

ânimo QUANTAS VEZES MORRE UM HOMEM?
A Espuma dos Dias Em ambos os casos aquele insuportável sentimento de fragilidade, aquela consciência de que para morrer basta efectivamente estar vivo, aquela interrogação perante o grande absurdo, aquele bradar aos céus.

terça-feira, janeiro 27, 2004

ABRUPTO Com vontade de fugir desta insuportável mediocridade. Desta falta de respeito pelos mortos. Desta falta de dignidade. Desta falta de ar.
little black spot não, não, não me ficou marcado o célebre «E.T. phone home...». foi depois, no limite do (in)suportável, que se constituiu a minha memória do filme. se me perguntarem alguma vez sobre a minha infância, bastar-me-á apenas dizer que foi assim:

«Elliot - Stay...
E.T. - Come...»
Outro, eu Brutal Não se sabe ainda se Féher, jogador de futebol do Benfica, já recuperou a consciência. Aparentemente, foi vítima de paragem cardíaca prolongada. A queda súbita de um atleta de alta competição, inanimado, em campo, depois de um sorriso, faz lembrar, brutalmente, a precariedade da vida.

segunda-feira, janeiro 26, 2004

A Natureza do Mal Miklos Feher
Um rapaz louro da Hungria que jogava futebol. Um rapaz que marcava golos. Um rapaz que sorria, no momento preciso em que qualquer coisa, incrivelmente necessária, dentro de si se desligou. Um rapaz a morrer em directo em frente a uma câmara.
Era suplente. Entrou perto do fim. Fintou quanto pôde e fez uma falta para ganhar tempo. Mas a morte não se enganou.
Ponto & Vírgula Amanhã faremos a elegia dos mortos nos atentados, nos crimes de faca e alguidar, nas incapacidades da medicina, nos becos e estradas afiadas como lâminas, nas rugas que contam mais histórias que a maioria das enciclopédias.

Hoje todas as elegias vão para Miklos Feher, que tinha 24 anos para trás e uns bons 50 pela frente. Hoje choramos este impressionante adeus. Os outros, amanhã.

sexta-feira, janeiro 23, 2004

Outro, eu Curiosidade No momento em que, todos os dias, nos chegam informações (e imagens) espantosas de Marte, pressinto - sem qualquer tipo de conhecimento de causa, directo ou indirecto - que está em curso uma fortíssima (e surda) competição nos bastidores do palco científico. A Agência Espacial Europeia (ESA) e a NASA estão, claramente, em despique nesta batalha pela conquista do conhecimento de Marte. Depois do fiasco da Beagle 2, os americanos pareceram ganhar vantagem com as extraordinárias fotografias captadas pelo Spirit. De ontem para hoje deu-se um (pelo menos aparente) volte-face: o Spirit, com uma avaria grave, pode estar em risco e a ESA encontra água no pólo sul de Marte. O que eu não dava para poder cheirar o ambiente de um e doutro lado.
Terras do Nunca Vermelho vivo
A sonda europeia Mars Express encontrou água em Marte.
As grandes notícias escrevem-se em poucas linhas.
Flor de Obsessão CLICHÉS: Ouço alguém insurgir-se contra as ideias feitas. Contra os clichés. Não percebo tamanho desespero, tamanha fúria contra o óbvio. Seremos forçados a debitar Espinosa em todas as ocasiões? Não. Há ideias feitas lindas, profundas, irrefutáveis. Quem se incomoda com as ideias feitas, quem reage repulsivamente à banalidade, está incomodado e inquieto com outra coisa. Com a sua própria incapacidade de pensar.

quinta-feira, janeiro 22, 2004

Sublinhar Frases...apenas frases (1)
Cada casa é uma âncora lançada em terra livre.

quarta-feira, janeiro 21, 2004

Rua da Judiaria Convém referir que, tal como acontece com o cristianismo, existem no judaísmo diversas correntes teológicas e movimentos religiosos com interpretações divergentes, pelo que este “credo” funciona apenas como uma amostra genérica daquilo em que os judeus acreditam. A este respeito, há um velho provérbio hebraico que diz “onde há dois judeus tem de haver duas sinagogas”.
Terras do Nunca A versão brasileira do Aviz parou no dia 17, indiferente à original, que prosseguiu caminho.
Às vezes, as máquinas são assim. Comovem-se com os passos do criador, também elas partem atrás do Cruzeiro do Sul.